Sabia que um projeto inacabado de Steven Spielberg influenciou diretamente três filmes de sucesso? Aliás, três dos mais bem sucedidos e icônicos filmes dos anos 1980. Chamado de “Night Skies” (ou “Céus Noturnos”), a produção foi concebida por Spielberg para ser uma continuação de Contatos Imediatos do Terceiro Grau, filme dirigido por ele e lançado em 1977. O projeto foi encomendado pela Columbia Pictures, estúdio que havia distribuído Contatos Imediatos, e que queria tirar proveito do enorme sucesso de público e crítica do filme.
A princípio, Steven Spielberg não tinha interesse na produção de uma continuação de Contatos Imediatos, mas, ao mesmo tempo, o cineasta queria evitar o que aconteceu com Tubarão (1975), onde a Universal Pictures produziu diversas continuações (a maioria ruins) sem sua participação. Por isso, ele decidiu embarcar no projeto. Originalmente, a continuação seria um filme de terror, que contaria a história de uma família aterrorizada por um grupo de alienígenas maus.
O filme, que se chamaria, a princípio, “Watch the Skies”, era baseado em um “caso real” ocorrido no estado americano do Kentucky, em 1965, quando uma família alegou que estava sendo aterrorizada por um grupo de criaturas alienígenas (parecidas com Gremlins). Spielberg havia tomado conhecimento da história durante suas pesquisas para a elaboração do roteiro de Contatos Imediatos e agora iria utilizá-la em sua continuação.

No roteiro, o grupo de alienígena seria formado por 11 criaturas que seriam cientistas estudando os animais da Terra em busca de vida inteligente. Eles, primeiro, dissecariam animais e depois, voltariam sua atenção para os humanos. Spielberg chegou a contratar o diretor e roteirista John Sayles, para desenvolver o roteiro do filme, que passou a se chamar “Night Skies” devido a problemas de direitos autorais com o nome original. Até mesmo o genial maquiador Rick Baker foi contratado para trabalhar no projeto e chegou a gastar 70 mil dólares para desenvolver protótipos dos alienígenas.
O filme começaria a ser rodado assim que Spielberg terminasse as filmagens de Os Caçadores da Arca Perdida (1981). Contudo, agora, ele não seria mais o diretor de Night Skies, apenas produziria o filme que seria dirigido por Tobe Hooper, conhecido por ser especialista na direção de filmes de terror. O roteiro de Sayles chegou, inclusive, a ser entregue, mas ainda trabalhando em Os Caçadores da Arca Perdida, Spielberg começou a ter dúvidas sobre o projeto. Já que ele queria fazer um filme mais leve, mais tranquilo e mais parecido com o “estilo” de Contatos Imediatos.
Um encontro com Melissa Mathison e Night Skies toma outro caminho
Coincidentemente, nessa época, Melissa Mathison estava visitando as filmagens de Os Caçadores da Arca Perdida, já que seu (então) namorado, Harrison Ford, era protagonista do filme. Assim, Steven Spielberg mostrou o roteiro de Night Skies, escrito por John Sayles, para ela. Na versão final da história escrita por Sayles, os alienígenas eram agora cinco e não 11, como antes. Entre esses cinco, três se destacavam: Scar, o vilão principal do filme que tinha um dedo de onde saia uma luz e com o qual ele conseguia matar animais, Squirt e Buddy.
Esse último era um alienígena bonzinho que acabava se tornando amigo do filho autista da família aterrorizada pelos outros alienígenas e, por não ser como os outros, acabava sendo deixado para trás na Terra, por seus companheiros. Mathison se apaixonou pela história de Buddy e a partir dela, desenvolveu o roteiro de “ET e Eu”, que se tornaria a base para E.T. O Extraterrestre (1982), que conta a história de uma criatura alienígena deixada por engano na Terra e que acaba formando um laço de amizade com um garotinho.

Contudo, como já dissemos em um de nossos textos anteriores, a Columbia Pictures não quis bancar a produção do filme por achar sua história muito infantil e concentrada em personagens infanto-juvenis, o que o estúdio acreditava que limitaria a parcela do público que teria interesse em assisti-lo. Assim, Steven Spielberg, convenceu a Universal Pictures a adquirir, por um milhão de dólares, o roteiro do filme e a bancar sua produção. Como sabemos, a Columbia cometeu um grande erro. E.T. foi um enorme sucesso de bilheteria, arrecadando 619 milhões de dólares no mundo todo e se tornando dono da maior bilheteria da história do cinema na época.
Poltergeist – mais um filme gerado a partir de Night Skies
O mais interessante é que Night Skies não gerou apenas E.T. O Extraterrestre. Diversos elementos do filme também foram usados em outro grande sucesso do cinema lançado em 1982, o terror Poltergeist – O Fenômeno, cuja história foi concebida por Steven Spielberg, que também co-escreveu seu roteiro, e que foi dirigido exatamente por Tobe Hooper, que iria originalmente dirigir Night Skies.
A história de Poltergeist utiliza a principal ideia do roteiro de Night Skies, que é o de uma família sendo aterrorizada por criaturas desconhecidas. Contudo, aqui, ao invés de alienígenas, essas criaturas são, na verdade, espíritos e fantasmas. A ideia de retirar os aliens e colocar os fantasmas teria sido do próprio Hooper, que ao ser convidado a dirigir Night Skies tentou convencer Spielberg a transformar o filme em um terror clássico e abandonar totalmente as partes de ficção científica que o roteiro do filme ainda possuía, já que Hooper só tinha interesse em dirigir, na época, cinema de terror.

Com o cancelamento de Night Skies, Tobe Hooper acabou se envolvendo na direção de Poltergeist. Contudo, até hoje, existe uma polêmica sobre em que medida ele realmente dirigiu o filme, com muita gente alegando que Steven Spielberg foi o real diretor do longa-metragem e Hooper simplesmente ficou com os créditos. Isso porque, Spielberg tinha um contrato com a Universal Pictures, para dirigir E.T. O Extraterrestre, que o proibia de dirigir qualquer outro filme naquele ano. Assim, segundo essa versão da história, ele dirigiu Poltergeist e Hooper apenas “assinou” a direção do filme para evitar problemas com o estúdio.
O certo é que muita gente alega que a ingerência criativa de Steven Spielberg foi tão grande durante a produção de Poltergeist, que ele deveria receber ao menos os créditos como co-diretor do filme. É evidente também que a obra, inegavelmente, tem muito do estilo de Spielberg e, em alguns momentos, até mesmo se assemelha esteticamente a E.T. O Extraterrestre, que o diretor estava dirigindo naquele momento. É claro que Tobe Hooper nega veementemente essa história e alega que ele é o único diretor de Poltergeist que, aliás, é um dos principais filmes de sua filmografia.
Gremlins – Outro filme influenciado por Night Skies
O mais incrível é que a influência de Night Skies não para por aí. O projeto nunca completado seria fundamental também na produção de outro sucesso, Gremlins (1984). Apesar de a ideia inicial para o filme ter sido concebida originalmente por Chris Columbus, o produto final teve muita influência de Steven Spielberg. Isso porque, o primeiro roteiro de Gremlins, escrito por Columbus, não foi concebido com a intenção de se tornar um filme, mas sim para ser usado como uma espécie de portifólio. Uma amostra do talento de Columbus, que mostrava o roteiro para diretores, produtores e estúdios interessados em contratá-lo.
Contudo, Spielberg teve acesso ao roteiro e se interessou em transformá-lo em filme. Para a direção de Gremlins foi contratado Joe Dante, que já havia dirigido dois filmes, Piranha (1978) e Grito de Horror (1981), cujos roteiros haviam sido escritos por John Sayles, o roteirista de Night Skies. Além disso, alguns elementos de Gremlins, como a aparência das criaturas e também o fato de um dos Gremlins ser bonzinho enquanto todos os outros são maus, foram claramente influenciados por Night Skies.

Steven Spielberg foi um dos produtores executivos de Gremlins que, aliás, foi produzido pela Amblin Entertainment, produtora que foi fundada e pertence a ele. Como quase tudo que envolveu Spielberg nos anos 1980, Gremlins foi um enorme sucesso de público. Produzido a um custo estimado de 11 milhões de dólares, o filme arrecadou quase 213 milhões de dólares, se tornando dono da quarta maior bilheteria do ano de 1984.